Treinador do Cova da Piedade passou seis dias nos cuidados intensivos (UCI) e nove nos intermédios do Hospital de São Bernardo
Toni Pereira.Foto de Arquivo - Joaquim Candeias |
O treinador do Cova da Piedade, António Pereira, sobreviveu ao surto do novo coronavírus, que atingiu a equipa da II Liga de futebol, experiência que o leva a afirmar hoje que “o jogo da vida é o mais importante”.
Aos 64 anos, o técnico passou seis dias nos cuidados intensivos (UCI) e nove nos intermédios do Hospital de São Bernardo, em Setúbal, onde esteve “sempre consciente” e os médicos nunca lhe esconderam a gravidade extrema da sua situação.
“Disseram logo ‘você tem aqui um TAC, está muitíssimo mal, é muitíssimo grave’. Tal e qual estas palavras. ‘Os primeiros oito a dez dias são fundamentais. Se o seu corpo reagir, você safa-se. Se não reagir, senhor Pereira, isto está muito mau, muito difícil’. Médicos que chegavam ao pé de mim, agarravam-me na mão e diziam ‘calma, senhor Pereira, calma’. Eles diziam-me a verdade, mas magoava. Eu sabia que ia morrer”, contou o treinador à agência Lusa.
António Pereira chegou a estar com o fluxo de oxigénio no sangue em 34, quando “dizem que a partir dos 40 ou 50 entra-se em coma”, e os médicos chegaram a dizer à sua família para ir-se “preparando” para o pior, até que, “felizmente, o corpo reagiu” e o técnico já voltou esta semana a orientar os treinos da equipa da margem sul do Tejo.
Mas antes de recuperar, sair da UCI, e, por fim, dos cuidados intermédios, Toni Pereira viu, literalmente, a vida a passar-lhe em revista à frente dos olhos e a morte ao seu lado.
“Lembrava-me de tudo. A única coisa que pensava era que ‘já não vou sair daqui’. Uma coisa tão grave como foi, as pessoas a dizerem-me, os médicos a agarrarem-me na mão e a fazerem-me festinhas, a confortarem-me… Como deve calcular, quando fazem uma coisa destas é um sinal”, relatou.
Enquanto esteve no hospital, Toni Pereira viu gente que “infelizmente morreu” mesmo ao seu lado, o que “ainda magoava mais”, ver pessoas “ali ligadas, entubadas, nos cuidados intensivos”, e pensava que “ia ser mais um daqueles que ia para o outro lado”.
Por isso, faz questão de agradecer, mais do que uma vez ao longo da conversa com a Lusa, “ao Hospital de São Bernardo, médicos, enfermeiros e pessoal auxiliar”.
“Vocês não fazem ideia o que eles trabalham e o que eles sofrem. Dentro daqueles fatos, então! Eu não posso agradecer de outra maneira a não ser pela comunicação social. Foi uma coisa que eu não tenho o mínimo a dizer de ninguém. Nos cuidados intensivos, os médicos, assim que entravam era comigo que iam ter. Foram dias e noites… Uma enfermeira que dormiu ali em frente a mim nas noites que eu lá estive. Como é que eu posso agradecer se não forem vocês a divulgar?”, questionou.
As noites na enfermaria e a tranquilidade que traziam eram, de resto, o momento em que caía o ‘escudo’ do homem que, aos 64 anos, “nunca tinha entrado num hospital”.
“Todos os dias chorava. Lembrava-me de tudo isto, mas essencialmente da minha mulher, da minha filha e da minha neta. [Pensava] que nunca mais a ia ver, [que] não conseguia ver a evolução dela e todos os dias eu chorava quando havia aquela calma na enfermaria. As pessoas não ouviam e as lágrimas corriam. Todos os dias chorei. Foi muito difícil, a vida hoje tem outro valor para mim”, assume.
Fonte:Lusa
Sem comentários:
Enviar um comentário